sábado, 30 de outubro de 2010

**Relacionamentos**

Recebi este texto da minha cunhada Zani, do qual convido vocês a uma sincera reflexão:

Apesar de uma "certa antipatia" por Rubem Alves por algumas coisas que comentarei em momento oportuno, não posso deixar de mencionar que ele escreve coisas bastantes significativas, sendo uma delas, para mim, este texto.

Ele está intitulado como "Relacionamentos" e sua narrativa discorre para "casamentos". Sim, claro, casamento é um relacionamento no qual os envolvidos estão num verdadeiro"batismo de fogo", aprendendo as duras favas do dia a dia sob o mesmo teto. Rotinas, problemas, amores, tédio, vontades, manias diferentes das nossas, procurando respeitar o que o outro pensa. MAs ante a um casamento, existe o conviver com "pessoas". Pessoas que tb tem manias, vícios, rotinas, problemas, personalidades fracas ou fortes, e que por vezes em nossas vidas, cruzamos em meio a elas, consagrando nossas diferenças ou semelhanças.

É bem certo que tais "diferenças/semelhanças" podem se modificar para sentimento oposto ao longo da vida, pois somos resilientes e, graças a Deus, a evolução está aí para fazer esse papel, estreitando laços ou encerrando ciclos, o importante é que, como diria nosso querido Tom Jobim em uma de seus mais belas canções "é impossível ser feliz sozinho". Uma outra frase bastante pertinente que li uma vez de Paulo Coelho "às vezes a melhor resposta que você pode dar à alguém é o silêncio", portanto, pensem nisso com carinho e super fim de semana.



Bjkas,

Syy







"Depois de muito meditar sobre o assunto concluí que os casamentos (relacionamentos) são de dois tipos: há os casamentos do tipo Tênis e há os casamentos do tipo Frescobol.

Os casamentos do tipo tênis são uma fonte de raiva e ressentimentos e terminam mal. Os casamentos do tipo Frescobol são uma fonte de alegria e têm a chance de ter vida longa. Explico-me.

Para começar, uma afirmação de Nietzsche, com a qual concordo inteiramente. Dizia ele: "Ao pensar sobre a possibilidade do casamento, cada um deveria se fazer a seguinte pergunta:"Você crê que seria capaz de conversar com prazer com esta pessoa até sua velhice?"Tudo o mais no casamento é transitório, mas as relações que desafiam o tempo são aquelas construídas sobre a arte de conversar.

Sherazade sabia disso. Sabia que os casamentos baseados nos prazeres da cama são sempre decapitados pela manhã, e terminam em separação, pois os prazeres do sexo se esgotam rapidamente, terminam na morte, como no filme O Império dos Sentidos. Por isso, quando o sexo já estava morto na cama, e o amor não mais se podia dizer através dele, Sherazade o ressuscitava pela magia da palavra: começava uma longa conversa sem fim, que deveria durar mil e uma noites. O sultão se calava e escutava as suas palavras como se fossem música.

A música dos sons ou da palavra - é a sexualidade sob a forma daeternidade: é o amor que ressuscita sempre, depois de morrer. Há os carinhos que se fazem com o corpo e há os carinhos que se fazem com as palavras. E contrariamente ao que pensam os amantes inexperientes. Fazer carinho com as palavras não é ficar repetindo o tempo todo:"Eu te amo".

Barthes advertia: "Passada a primeira confissão, eu te amo não quer dizer mais nada". É na conversa que o nosso verdadeiro corpo se mostra, não em sua nudez anatômica, mas em sua nudez poética.

Recordo a sabedoria de Adélia Prado: "Erótica é a alma".

Tênis é um jogo feroz. O objetivo é derrotar o adversário. E a sua derrota se revela no seu erro: O outro foi incapaz de devolver a bola. Joga-se tênis para fazer o outro errar. O bom jogador é aquele que tem a exata noção do ponto fraco do seu adversário, é justamente para aí que ele vai dirigir sua cortada. Palavra muito sugestiva - que indica o seu objetivo sádico, que é o de cortar, interromper, derrotar. O prazer do tênis se encontra, portanto, no momento em que o jogo não pode mais continuar porque o adversário foi colocado fora de jogo. Termina sempre com a alegria de um e a tristeza de outro.

Frescobol se parece muito com o tênis: dois jogadores, duas raquetes e uma bola. Só que, para o jogo ser bom, é preciso que nenhum dos dois perca. Se a bola veio meio torta, a gente sabe que não foi de propósito e faz o maior esforço do mundo para devolvê-la gostosa, no lugar certo, para que o outro possa pegá-la. Não existe adversário porque não há ninguém a ser derrotado. Aqui ou os dois ganham ou ninguém ganha. E ninguém fica feliz quando o outro erra. O erro de um, no frescobol, é um acidente lamentável que não deveria ter acontecido. E o que errou pede desculpas, e o que provocou o erro se sente culpado. Mas não tem importância: começa-se de novo este delicioso jogo em que ninguém marca pontos...

A bola: são nossas fantasias, irrealidades, sonhos sob a forma de palavras. Conversar é ficar batendo sonho prá lá, sonho prá cá....

Mas há casais que jogam com os sonhos como se jogassem tênis. Ficam à espera do momento certo para a cortada. Tênis é assim: recebe-se o sonho do outro para destruí-lo, arrebentá-lo, como bolha de sabão.. O que se busca é ter razão e o que se ganha é o distanciamento. Aqui, quem ganha sempre perde.

Já no frescobol é diferente: o sonho do outro é um brinquedo que deve ser preservado, pois se sabe que, se é sonho, é coisa delicada, do coração. O bom ouvinte é aquele que, ao falar, abre espaços para que as bolhas de sabão do outro voem livres ao vento. Bola vai, bola vem - cresce o amor...

Ninguém ganha, para que os dois ganhem. E se deseja então que o outro viva sempre, eternamente, para que o jogo nunca tenha fim..."

2 comentários:

Impressões disse...

Que lindo texto amiga... não conhecia, fiquei curiosa pra saber do porque não gosta de Rubem Alves, adoro os textos dele, foi perfeita essa comparação do tenis com o frescobol... Um super beijo! TAM!!

Musa lispectoriana** disse...

Não disse que não gosto de Rubem Alves, e sim que tenho "uma certa antipatia" por ele. E tal se deve ao fato de, há anos atrás, presenciei uma palestra com diversos autores na Universidade de Sorocaba(UNISO), na qual os organizadores já sabendo do repertório que Rubem ALves pessoalmente redigiria, fizeram uma surpresa a ele, tal qual o mensuraria. Se tratava de belas canções tocadas por belos violinos e vozes magníficas debaixo de uma árvore florida numa dessas tardes maravilhosas.
O que se sucedeu, foi que Rubem Alves, ao se deparar e passar defronte o fato que ele tanto floreou através de belas palavras, simplesmente, passou...Sequer perdeu alguns de seus preciosos e caros segundos para admirar e "reparar" na "coincidência" dos fatos, agindo com a maior indiferença, só retornando quando um dos sensíveis organizadores foi buscá-lo alertando-o para tal fato, tsc, tsc...Ninguém pode passar pela vida ocm tanta pressa, que não pode reparar em coisas com as quais idealiza tanto.
Desde então vejo Rubem Alves assim: um homem que tem o maior dom com as palavrinhas que estão todas aí, soltas no ar e que só poucos conseguem organizá-las de forma tão brilhante e profundas. Porém, mesmo com todo esse "dom", Rubem ALves para mim é um homem que aplica um discurso e na prática atua totalmente diferente. Você dentre tantas pessoas que conheço, sabem muito bem que ABOMINO esse tipo de comportamento, sobretudo diante coisas que julgo tão importantes, que são essas que "ganhamos de presente" da vida.

Antipático mesmo, você não acha? Só isso.


Beijos